Introdução
Atualmente, a homossexualidade vem sendo duramente atacada por um ruidoso grupos de fundamentalistas religiosos que se utilizam de trechos bíblicos para respaldar sua falta de amor ao próximo e de conhecimento científico. Como psiquiatra, espírita e blogueira, senti que devia dar minha contribuição de alguma forma e optei por tentar mostrar o que o Espiritismo diz sobre o homossexualismo, não sem antes mostrar brevemente alguns controversos trechos bíblicos, bem como a atual visão científica.
A Bíblia
Jesus nada disse sobre a homossexualidade e o que contém na Bíblia vem de traduções, muitas vezes equivocadas, feitas sob o interesse das religiões ditas cristãs. No blog Espiritualidade Inclusiva, existem diversos textos que fundamentam o que eu acabei de dizer. Destaco os artigos a seguir:
- O que todo cristão deve saber sobre homossexualidade
- Destruindo sofirmas cristãos
Não há, na Bíblia, nenhuma só vez as palavras homossexual, lésbica ou homossexualidade. Todas as Bíblias que empregam estas expressões estão erradas e mal traduzidas. A palavra homossexual só foi criada em 1869, reunindo duas raízes linguísticas: Homo (do Grego, significando “igual”) e Sexual (do latim). Portanto, como a Bíblia foi escrita entre 2 e 4 mil anos atrás, não poderiam os escritores sagrados terem usado uma palavra inventada só no século passado. Se em tua bíblia aparece o termo homossexual, está errada. Elementar, irmão!
As mais modernas e abalizadas pesquisas exegéticas concluem que, se o ex-fariseu Paulo de Tarso quisesse condenar especificamente os praticantes do homoerotismo, teria empregado o termo corrente em sua época e de seu pleno conhecimento, “pederastas”. Em vez desta palavra, Paulo usou as expressões gregas “malakoi”, “arsenokoitai” e “pornoi” – que as melhores edições da Bíblia em português traduzem por “perversores”, “pervertidos” e “imorais”.
Além do blog citado, recomendo a leitura do livro O que a Bíblia realmente diz sobre a homossexualidade, do padre, teólogo e psicólogo Daniel Helminak.
Mais especificamente, na época bíblica não havia uma compreensão muito elaborada da homossexualidade como orientação sexual. Havia apenas uma consciência genérica de atos ou contatos entre pessoas do mesmo sexo, o que poderia ser chamado de homogenitalidade ou atos homogenitais. A questão atualmente gira em torno das pessoas e seus relacionamentos, e não simplesmente de seus atos sexuais. O que se discute hoje é a homossexualidade, e não mais a mera homogenitalidade, e o afeto espontâneo por pessoas do mesmo sexo e a possibilidade ética de expressar este afeto em relacionamentos sexuais e amorosos. Como esta não era uma questão que os autores bíblicos tinham em mente, não podemos esperar que a Bíblia nos dê uma resposta.
Na Wikipedia, fala-se também sobre o termo malakoi e vemos, claramente, que não existe um consenso quanto a correta tradução:
Quanto a palavra malakoi (que literalmente significa “mole”, “macio”) já houve versões bíblicas que a traduziram como “depravados”, “pervertidos”, “efeminados”, “efebos”, “meninos prostitutos” e algumas versões modernas chegaram até mesmo a falar em “homossexuais”. Entretanto, até a Reforma no século XVI e no Catolicismo no século XX, pensava-se que tal palavra significasse “masturbadores”. Sabe-se, porém, que para além de seu sentido literal de “mole” ou “macio”, tal termo, quando usado para adjetivar pessoas, pode também ser entendido como “lasso”, “irrefreável”, “devasso” (Homossexualidade na Bíblia)
O que diz a ciência
A homossexualidade deixou de ser considerada doença pela Associação Americana de Psiquiatria em 1973. No Brasil, em 1985, o Conselho Federal de Psicologia deixou de considerar a homossexualidade como um desvio sexual e, em 1999, estabeleceu regras para a atuação dos psicólogos em relação àsquestões de orientação sexual.
Art. 1° – Os psicólogos atuarão segundo os princípios éticos da profissão notadamente aqueles que disciplinam a não discriminação e a promoção e bem estar das pessoas e da humanidade. Art. 2° – Os psicólogos deverão contribuir, com seu conhecimento, para uma reflexão sobre o preconceito e o desaparecimento de discriminações e estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas homoeróticas. Art. 3° – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados. Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades. Art. 4° – Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica. Resolução 01/99
Como se pode perceber, para a ciência a homossexualidade não precisa de “cura”, visto não ser uma doença. Hoje é considerada apenas como uma “orientação sexual” dentro de uma “diversidade”.
E qual seria a visão espírita do homossexualismo?
Para escrever este post, fiz algumas pesquisas no Google e também me baseei em livros que já li. Kardec nada disse a respeito, mas encontramos nos livros de Emmanuel e de André Luiz referências importantes sobre o tema. O querido Chico Xavier, inspirado por Emmanuel, fez uma preleção no Programa Pinga Fogo na extinta Tv Tupi, em 1971:
Em declaração ao Jornal Folha Espírita de 1984, Chico disse:
“Não vejo pessoalmente qualquer motivo para criticas destrutivas e sarcasmos incompreensíveis para com nossos irmãos e irmãs portadores de tendências homossexuais, a nosso ver, claramente iguais às tendências heterossexuais que assinalam a maioria das criaturas humanas. Em minhas noções de dignidade do espírito, não consigo entender porque razão esse ou aquele preconceito social impediria certo numero de pessoas de trabalhar e de serem úteis à vida comunitária, unicamente pelo fato de haverem trazido do berço características psicológicas e fisiológicas diferentes da maioria. (…)
No site do Instituto André Luiz encontramos opiniões de Emmanuel e de André Luiz sobre o homossexualismo.
A homossexualidade, também hoje chamada transexualidade, em alguns círculos de ciência, definindo-se, no conjunto de suas características, por tendência da criatura para a comunhão afetiva com uma outra criatura do mesmo sexo, não encontra explicação fundamental nos estudos psicológicos que tratam do assunto em bases materialistas, mas é perfeitamente compreensível, à luz da reencarnação (…) e o mundo vê, na atualidade, em todos os países, extensas comunidades de irmãos em experiência dessa espécie, somando milhões de homens e mulheres, solicitando atenção e respeito, em pé de igualdade ao respeito e à atenção devidos às criaturas heterossexuais.(Emmanuel)
Já o espírito Ramatis, no livro “Sobre a Luz do Espiritismo”, ditado através da mediunidade de Hercílio Maes, declara:
PERGUNTA: — A tendência de buscar uma comunhão afetiva com outra criatura do mesmo sexo, conhecida por homossexualidade, implica em conduta culposa perante as leis Espirituais? RAMATÍS: — Considerando-se que o “reino de Deus” está também no homem, e que ele foi feito à imagem de Deus, evidentemente, o pecado, o mal, o crime e o vício são censuráveis, quando praticados após o espírito humano alcançar frequências muito superiores ao estágio de infantilidade. Os aprendizados vividos que promovem o animal a homem e o homem a anjo, são ensinamentos aplicáveis a todos os seres. A virtude, portanto, é a prática daquilo que beneficia o ser; nos degraus da imensa escala evolutiva. O pecado, a culpa, são justamente, o ônus proveniente de a criatura ainda praticar ou cultuar o que já lhe foi lícito usar e serviu para um determinado momento de sua evolução. A homossexualidade, portanto, de modo algum pode ofender as leis espirituais, porquanto, em nada, a atividade humana fere os mestres espirituais, assim como a estultícia do aluno primário não pode causar ressentimentos no professor ciente das atitudes próprias dos alunos imaturos. Pecados e virtudes em nada ofendem ou louvam o Senhor, porém, definem o que é “melhor” ou pior para o próprio ser, buscando a sua felicidade, ainda que por caminhos intrincados dos mundos materiais, sem estabilidade angélica. A homossexualidade não é uma conduta dolosa perante a moral maior, mas diante da falsa moral humana, porque, os legisladores, psicólogos, e mesmo cientistas do mundo, ainda não puderam definir o problema complexo dos motivos da homossexualidade, entretanto, muitos o consideram mais de ordem moral do que técnica, científica, genética ou endócrina. Fonte: Grupo Universalista Jesus em seu lar
Em outra pergunta, Ramatis confirma a declaração de Emmanuel:
PERGUNTA: — Mas o que realmente explica o fenômeno da homossexualidade? RAMATÍS: — É assunto que não se soluciona sobre as bases científicas materialistas, porque, só podereis entendê-lo e explicá-lo, dentro dos princípios da reencarnação.
Como podemos notar, irmãos, para a Doutrina Espírita o homossexualismo é apenas uma estágio evolutivo que não fere as Leis Divinas e muito menos se trata de um equívoco do Criador. O que vale é a reforma íntima, independente da orientação sexual.
PERGUNTA: — Que dizeis desse estigma de homossexualidade, quando as opiniões se dividem, taxando tal fenômeno de imoral, e outros de enfermidade? RAMATÍS: — Sob a égide da severa advertência do Cristo, em que “não julgueis para não serdes julgados”, quem julgar a situação da criatura homossexual de modo antifratemo e mesmo insultuoso, não há dúvida de que. a Lei, em breve, há de situá-lo na mesma condição desairosa, na próxima encarnação, pois, também é de Lei “ser dado a cada um segundo a sua obra”. Considerando-se nada existir com propósito nocivo, fescenino, imoral ou anormal, as tendências homossexuais são resultantes da técnica da própria atividade do espírito imortal, através da matéria educativa. Elas situam o ser numa faixa de prova ou de novas experiências, para despertar-lhe e desenvolver-lhe novos ensinamentos sobre a finalidade gloriosa e a felicidade da individualidade eterna. Não se trata de um equívoco da criação, porquanto, não há erro nela, apenas experimento, obrigando a novas aquisições, melhores para as manifestações da vida.
O Dr. Andrei Moreira, presidente da Associação Médico-Espírita de Minas Gerais, em entrevista concedida para o médium e terapeuta Wanderley Oliveira, diz:
O Espiritismo recomenda a todas as criaturas a conscientização a respeito da sacralidade do corpo físico e da sexualidade, como fonte criativa e criadora, destinada a ser fonte de prazer físico e espiritual, sobretudo de realização íntima para o ser humano, em todas as suas formas de expressão.
- Entrevista sobre Homossexualidade com Andrei Moreira – 15/09/2010
- Vídeo: homosexualidade sob a ótica do espírito imortal
Para o Dr Inácio Ferreira, médico psiquiatra desencarnado em 1988 e que escreve a partir da mediunidade de Carlos Baccelli:
O homossexualismo deve ser compreendido por nós outros como uma das muitas experiências que o espírito vivencia em sua trajetória, para que, finalmente, aprenda a verdadeiramente amar para além dos implementos genésicos que o caracterizam como homem ou mulher! Com o meu carinho, o irmão sempre agradecido, INÁCIO FERREIRA Uberaba – MG, 8 de setembro de 2009
- Dr. Inácio Ferreira: União Homoafetiva
- Dr.Inácio Ferreira: Homossexualidade
- Homossexualismo – Dr Inácio Ferreira
Na Wikipedia encontramos um parágrafo que reforça tudo que foi citado até aqui:
O Espiritismo crê que o espírito humano não tem sexo e que um mesmo espírito pode em diferentes encarnações habitar igualmente o corpo de um homem ou de uma mulher, sendo capaz de amar homens e mulheres. Não existe uma posição oficial sobre a homossexualidade. Alguns doutrinadores, como José B. de Campos, pregam que a questão mais importante no tocante à homossexualidade é a promiscuidade, aconselhando o homossexual a tomar um parceiro e constituir um lar [13]. O doutrinador e médium Divaldo Franco posiciona-se de forma semelhante, frisando que o homossexual, como o heterossexual, será julgado conforme sua conduta moral, independente da sexualidade[14]. (Homossexualidade e religião)
Minha Opinião
Antes de mais nada, quero dizer que respeito a Bíblia e seus seguidores de boa-fé, mas eu sou uma pessoa da ciência e com ela tento seguir. Além de ser psiquiatra há quase 20 anos, sou espírita talvez desde que nasci (risos) e li inúmeras obras espíritas e umbandistas. Tive também a oportunidade de conversar com as próprias Entidades que trabalham no Centro que frequento, sobre esse e outros temas. Eu penso como os renomados autores que citei, que a homossexualidade é apenas uma estágio evolutivo e que o que vale para Deus são as intenções e sentimentos de seus filhos. O caráter nada tem a ver com orientação sexual. Afinal, vemos a todo momento heterossexuais matando, roubando, traindo e por aí vai. A minha intenção ao escrever este post foi atingir os irmãos que se encontram em conflito entre sua sexualidade e seu amor a Deus. O Espiritismo Consolador nos mostra – através de seus repórteres do além – que a homossexualidade não fere as Leis Divinas. Amem-se e se respeitem. Foi o que Jesus ensinou. O Mestre jamais condenou a homossexualidade e sempre exaltou a importância do AMOR.
Como o Pai me amou, também eu vos amei; permanecei no meu amor. (João 15:9). Não julgueis, pois, para não serdes julgados; porque com o juízo que julgardes os outros, sereis julgados; e com a medida com que medirdes, vos medirão também a vós. (Mateus, VII: 1-2).
Se mesmo com o conhecimento espírita, caro irmão ou irmã, seu conflito persistir, procure auxílio com psiquiatra ou psicólogo; tenho certeza que esses profissionais poderão auxiliá-los em busca da paz consigo mesmos. E para finalizar deixo este excelente vídeo, que é uma bela resposta aos fundamentalistas 😉
Outros links relacionados a visão espírita sobre a homossexualidade:
- Resposta do Dr. Inácio a uma mãe cujo filho é homossexual
- José Medrado reponde pergunta sobre homossexualidade (video)
- Rompendo limites – a sexualidade na visão do espírita José Medrado (dvd)
- A Visão Espírita da União Estável Homossexual por Divaldo Franco (video)
- Homossexualismo e Espiritismo – entrevista com José Medrado (video)
- Umbanda e Sexualidade – Sacerdote Alexandre Cumino
- Rubens Saraceni fala a visão umbandista sobre homossexualismo no programa da Hebe Camargo
- Richard Simonetti – Casamento Gay (Facebook)
- Casamento homossexual, cura gay, adoção (vídeo)
Você é católico (a)? Então assista a opinião do Padre Fábio de Melo:
É protestante? Leia a opinião do arcebispo da Igreja Anglicana Desmond Tutu:
- Desmond Tutu e a inclusão de gays na Igreja
O Jesus a quem eu louvo provavelmente não colabora com aqueles que difamam e perseguem uma minoria já oprimida. Eu mesmo não poderia me opôr contra a injustiça de penalizar as pessoas por algo que elas não podem fazer
E do teólogo e pastor presbiteriano Alexandre Cabral:
- Pastor compara evangélicos que perseguem gays a nazistas
Cabral argumentou que o ápice do cristianismo são as revelações de Jesus, e nas quais não há nada que condene a homossexualidade. Por isso ele criticou os pastores que fazem uma leitura seletiva da Bíblia com o objetivo de perseguir os homossexuais. Argumentou que nem tudo o que está na Bíblia deve ser seguido, como matar quem não usa barba ou quem come crustáceos ou ainda manter a mulher confinada em seu período de menstruação.